A alegria da Torá

Você já se perguntou o que aconteceria se tratássemos a Torá como tratamos o nosso celular?

Se a carregássemos o dia inteiro em nossas bolsas ou bolsos?
Se abríssemos para dar uma olhada várias vezes ao dia, o dia inteiro?
Se fosse a última coisa que checamos antes de dormir?
Se voltássemos para buscá-la quando percebemos que a esquecemos em casa?
Se a usássemos para receber mensagens?
Se a tratássemos como se não pudéssemos mais viver nem um único dia sem ela?
Se a déssemos como um presente especial aos nossos filhos?
Se sempre a levássemos, e usássemos, quando viajamos?
Se sempre pensássemos em usa-la em caso de emergência?
 
Porém, diferente do nosso telefone celular, não precisaríamos nos preocupar com a Torá, pois ela nunca se desconecta, numa fica fora de serviço e nunca fica sem bateria. E o melhor de tudo é que com a Torá nunca há nenhuma chamada perdida…
 
Esta reflexão nos ajuda a pensar: onde estão as nossas prioridades? 
 


Este Shabat coincide com a festa de Sucót, e por isso não é lida a Parashat semanal, e sim um trecho especial relacionado com Sucót. E no Domingo de noite (04 de outubro) começa a festa de Shemini Atseret, que apesar de vir logo após Sucót, é uma festa independente, que representa o imenso amor que D'us sente pelo povo judeu. Este amor pode ser percebido através de um detalhe interessante: durante os 7 dias de Sucót eram oferecidos 70 Korbanót (sacrifícios), enquanto em Shemini Atseret apenas um Korban era oferecido. Por que esta diferença tão gritante?
 
O Rav Yaacov Kranz zt”l (Bielorrúsia, 1740 – Polônia, 1804), mais conhecido como Maguid MiDuvno, responde utilizando um Mashal (parábola). Ele explica que a diferença entre os Korbanót se compara a um homem muito rico, com muitos enteados e filhos, que precisou fazer uma longa viagem. Durante o tempo em que esteve longe, ele fez questão de comprar muitos presentes. Mas quando voltou para casa, deu aos seus enteados muitos presentes, enquanto para seus próprios filhos ele deu apenas algumas lembrancinhas. Quando questionado sobre sua atitude, ele explicou que para deixar seus enteados felizes era necessário muitos presentes, mas seus filhos já estavam tão felizes com a sua volta que não era necessário mais do que algumas lembrancinhas para alegrá-los. O mesmo conceito de aplica em relação aos Korbanót. Durante Sucót, os Korbanót eram oferecidos em nome de todas as nações do mundo, não apenas em nome do povo judeu, como se fosse uma grande confraternização universal. Mas em Shemini Atseret é como se D'us pedisse mais um dia de festa, mas desta vez a sós com o povo judeu. Para o povo judeu a felicidade da proximidade de D'us já é algo tão grande e especial que não é mais necessário uma grande quantidade de Korbanót para nos alegrar.
 
E foi justamente por causa desta alegria de nos sentirmos próximos de D'us que nossos sábios fixaram a festa de Simchá Torá junto com Shemini Atseret (fora de Israel, que são dois dias de festa, Simchá Torá é comemorada apenas no 2º dia). Em Simchá Torá foi fixado o término do ciclo de leitura da Torá, sendo lida a última Parashat, Vezót HaBrachá, que traz as Brachót (Bençãos) dadas por Moshé para cada uma das tribos de Israel antes de sua morte. Imediatamente após o termino da Torá nós a recomeçamos, lendo os versículos iniciais da Parashat Bereshit, que descrevem a criação do mundo.
 
Em Simchá Torá comemoramos por termos completado um ciclo completo de leitura da Torá e pelo seu recomeço. Costumamos cantar e dançar abraçados com o Sefer Torá, expressando nossa alegria por termos recebido de D'us a Torá e pela oportunidade de podermos estudar e aprender seus incríveis ensinamentos. Damos sete voltas em torno da “Bimá”, o lugar onde o Sefer Torá é lido, que normalmente fica bem no centro da sinagoga. Assim demonstramos que a Torá está no centro das nossas vidas.

Mas não é apenas de hoje que a Torá está no centro de nossas vidas. Desde quando estávamos no deserto, o povo viajava de maneira organizada, dividido em tribos, e o Mishkan (Templo Móvel) viajava no centro. No Mishkan havia o “Aron Hakodesh”, a Arca Sagrada na qual estavam guardadas as Tábuas com os 10 Mandamentos entregues por D'us ao povo judeu no Monte Sinai. Além do Aron Hakodesh, no Mishkan havia alguns outros utensílios, como a “Menorá” de ouro, a “Shulchan” (mesa de ouro, onde eram colocadas 12 Chalót de oferenda para D'us) e o “Ktoret” (altar onde eram oferecidos incensos).
 
Porém, há diferenças interessantes entre o Aron Hakodesh e os outros utensílios, que nos ensinam importantes lições sobre o nosso relacionamento com a Torá. Por exemplo, na construção da Shulchan está escrito: “E você deve fazer uma mesa” (Shemot 25:23), e na construção da Menorá está escrito: “E você deve fazer a Menorá de ouro puro” (Shemot 25:31). Mas em relação ao Aron Hakodesh há uma mudança na linguagem: “E eles devem fazer a Arca” (Shemot 25:10). Enquanto o comando da construção dos outros utensílios foi dirigido diretamente a Moshé, aparentemente o comando da construção do Aron Hakodesh foi dirigido ao povo inteiro.
 
Havia também uma diferença no transporte dos utensílios. Durante as viagens no deserto, todas as partes do Mishkan precisavam ser carregadas. D'us ordenou que fossem feitas argolas nos utensílios, e por dentro das argolas eram passadas barras revestidas de ouro. Eram estas barras que sustentavam os utensílios do Mishkan durante seu transporte. Mas isto só ocorria quando o povo judeu viajava, pois quando o povo acampava e os utensílios repousavam, as barras eram retiradas das argolas. Porém, em relação ao Aron Hakodesh está escrito: “Nas argolas do Aron devem estar as barras, elas não devem ser removidas dali” (Shemot 25:15). Por que estas diferenças e o que elas nos ensinam?
 
Explica o Sefer HaChinuch (Mitzva 96) que o motivo desta proibição de retirar as barras do Aron Hakodesh está no fato do Aron, que continha as Tábuas com os 10 Mandamentos, representar a Torá. A Torá é o centro das nossas vidas, é o que temos de mais valioso. Nós temos a obrigação de tratar a Torá com todo o respeito e honra possíveis. Caso surgisse alguma necessidade de mover o Aron HaKodesh rapidamente, na pressa as pessoas poderiam esquecer de checar se as barras estavam bem encaixadas, causando o risco do Aron Hakodesh cair. Em uma demonstração de muito respeito, as barras do Aron Hakodesh deveriam ficar fixas o tempo inteiro nas argolas. Isto nos ensina o quanto devemos nos preocupar em respeitar e honrar a nossa Torá.
 
Além disso, ensina o Midrash (parte da Torá Oral) que quando D'us comandou ao povo inteiro a construção do Aron HaKodesh, é como se Ele estivesse dizendo para Moshé: “Os outros utensílios você construirá, mas o Aron Hakodesh deixe que o povo inteiro participe, para que todos possam ter parte no mérito da Torá”. Como o Aron representa a Torá, sua construção foi dada para todo o povo, para que todos também tivessem uma parte na Torá e pudessem se dedicar ao seu estudo e aprofundamento.
 
Portanto, do Aron HaKodesh aprendemos duas lições importantes, para Simchá Torá e para nossas vidas: a primeira lição é que precisamos entender que a Torá é um presente incrível de D'us, algo de valor inestimável, mas que está ao alcance de todos. A segunda lição é que todos os nossos atos em relação à Tora devem ser de respeito e veneração. As viagens do Aron HaKodesh nos ensinam que devemos levar a Torá para todos os lugares para onde formos, porém sempre garantindo que ela será sempre querida e protegida, não importando onde estivermos e o que estivermos fazendo. A Torá não deve estar guardada apenas na sinagoga, ela deve fazer parte da nossa vida, do nosso cotidiano.
 
Em Simchá Tora temos a incrível oportunidade de dançar com o Sefer Torá. Mesmo aqueles que ainda não se dedicam ao estudo da Torá, neste dia podem ter a oportunidade de se ocupar com ela, da mesma maneira que todo o povo se ocupou com a construção do Aron Hakodesh. Abraçamos o Sefer Torá e o seguramos com carinho e respeito, demonstrando nossa alegria e nosso amor. Uma dança que durará por toda a eternidade.
 
Que Simchá Torá possa nos inspirar e nos ajudar a levar os ensinamentos da nossa sagrada Torá para o nosso cotidiano, para que possamos deixar a Torá nos transformar, a cada dia, em pessoas melhores.
 
SHABAT SHALOM e CHAG SAMEACH
 
Rav Efraim Birbojm 

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